NOTA INFORMATIVA 2 - IDENTIFICAR

Identificar riscos e impactos em direitos humanos

Conteúdo

IIIIIIII 1 Conceito de riscos e impactos em direitos humanos
IIIIIIII 2 Identificando riscos e impactos em direitos humanos
IIIIIIII 3 Saliência dos riscos em direitos humanos
IIIIIIII 4 Entendimento da(s) causa(as) raiz(es) dos reais e potenciais impactos identificados
IIIIIIII 5 Considerações sobre grupos vulneráveis
IIIIIIII 6 Desafios e recomendações
IIIIIIII 7 Checklist
IIIIIIII 8 Biblioteca de ferramentas


Objetivo da nota informativa

Nesta seção, serão abordadas as etapas associadas à identificação e avaliação dos riscos de violação dos direitos humanos, assim como entender os seus impactos às pessoas, nas comunidades e no meio ambiente.

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Conceito de riscos e impactos em direitos humanos

Para garantir a proteção e promoção dos direitos humanos, é fundamental identificar os impactos adversos aos direitos humanos, sejam eles potenciais (também conhecido como risco) ou reais, resultantes de suas atividades ou relações comerciais.

Esses impactos podem se manifestar de várias formas e afetar indivíduos ou grupos de diferentes maneiras, como frequentemente as mulheres, comunidades tradicionais, populações indígenas e defensores de direitos humanos que, em muitos casos, podem também apresentar outras camadas de vulnerabilidade (ex: um defensor de direitos humanos pode também ser um membro de uma comunidade indígena). Para isso, é fundamental identificar os impactos potenciais que ameaçam os direitos humanos, assim como os impactos específicos às pessoas, comunidades e meio ambiente.

Dentro de grupos específicos (ex: mulheres, pessoas negras, pessoas trans) pode haver “subgrupos” em condições de maior vulnerabilidade, muitas vezes devido a fatores de vulnerabilidade adicionais, que apresentam uma experiência de risco variada. Por exemplo, as mulheres tendem a enfrentar mais assédio e discriminação do que os homens. Mulheres migrantes, por não possuírem uma rede de apoio no país de destino, desconhecerem as regras culturais-idiomáticas, tendem a viver com uma maior probabilidade de trabalho forçado do que as não migrantes.

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Identificando riscos e impactos em direitos humanos

A identificação dos riscos em direitos humanos geralmente passa pelas seguintes etapas:

A. Análise do contexto geográfico, para um entendimento inicial a nível nacional e subnacional dos riscos no contexto de operação da empresa e abrangência de sua cadeia de fornecimento, incluindo os aspectos culturais existentes, estrutura e organização da comunidade do entorno, normas sociais, meios de subsistência ali presentes, distribuição do uso da terra, dentre outros fatores.

Possíveis fontes de informação:

Abaixo segue um exemplo de análise que pode ser produzido pela empresa coincidindo com os principais elementos da política de direitos humanos da empresa, seu tamanho e contexto operacional[1], dentre outros.

Para realizar uma denúncia ou divulgar formas para denunciar o trabalho análogo a escravidão ou trabalho infantil, acessar: https://ipe.sit.trabalho.gov.br.


[1] As empresas devem adaptar esse tipo de análise de acordo com seu contexto geográfico e operacional de atuação.

Contexto nacional: No caso do setor canavieiro, há farta bibliografia que informa como se deu sua implantação desde o período colonial e sua expansão em diferentes regiões brasileiras tendo como base as grandes propriedades. Hoje, as regiões onde a maior parte do açúcar é cultivada são o nordeste, centro-oeste e sudeste, cada uma com características particulares.

Setor canavieiro no Brasil: A indústria da cana-de-açúcar no Brasil desempenha um papel significativo na economia do país, sendo uma das principais produtoras e exportadoras de açúcar.

Riscos associadas a regiões geográficas: Apesar de não ser uma caracterização exclusiva, a forma de produção, a fiscalização e as regulações jurídicas influenciam os riscos relacionados aos direitos humanos de maneira regional, especialmente nas regiões sudeste-sul e nordeste do país.

Na região centro-sul, por exemplo, devido ao alto grau de mecanização e adoção de tecnologias avançadas na produção de cana-de-açúcar, as maiores incidências de violações de direitos humanos estão mais relacionadas a más condições de trabalho, remuneração inadequada e falta de acesso a direitos trabalhistas básicos.

Já na região nordeste, devido à grande demanda de trabalho manual, há grande incidência de trabalho infantil e adolescente nas plantações de cana-de-açúcar, assim como a exploração de mão de obra por meio de práticas de trabalho escravo.

Na região sudeste, especialmente nos Estados de São Paulo e Minas Gerais, devido à proibição das queimadas e predominância do corte mecanizado, no período da safra, há escassez de mão de obra local para a colheita, abrindo espaço para a migração sazonal de trabalhadores de outras regiões e de trabalhadores imigrantes. Esta migração muitas vezes deixa estes trabalhadores em situação de grande vulnerabilidade, abrindo espaço para que as violações de direitos humanos possam acontecer.

Por serem muitos trabalhadores temporários contratados durante a safra, alguns produtores não conseguem prover estrutura de saúde e segurança adequada, não controlam as jornadas de trabalho ou não fazem a contratação formal dos trabalhadores, entre outros riscos e impactos aos seus direitos.

Em resumo, o processo de devida diligência em direitos humanos pode ser uma ferramenta útil para identificar e compreender os riscos e suas respectivas causas raízes, a fim de informar as ações apropriadas a serem tomadas por empresas, individualmente e através de colaboração setorial.

B. Análise do contexto operacional, para um entendimento inicial sobre questões específicas da produção da matéria prima em questão e estrutura setorial, incluindo sistemas e iniciativas existentes, perfis de fornecedores e da mão de obra (ex: temporária, permanente, imigrantes), práticas trabalhistas comumente aplicadas etc.

Possíveis fontes de informação:

  • Documentos internos da empresa e de seus fornecedores.
    Exemplo: relatório de auditorias de 1ª, 2ª ou 3ª parte; procedimentos internos sobre questões trabalhistas, saúde e segurança; relatórios de análise de riscos; políticas existentes; planos de expansão etc.

  • Queixas registradas através do mecanismo de queixas a fim de identificar a existência de padrões históricos de queixas relacionadas a empresa e suas relações comerciais, e em seu setor ou região de atuação.

  • Consulta com partes interessadas e detentores de direitos.
    Exemplo: trabalhadores de diferentes categorias (com contrato de trabalho fixo, trabalhadores temporários, trabalhadores terceirizados); Sindicatos e federações de trabalhadores que representem as diferentes categorias citadas; lideranças de comunidades vizinhas; lideranças de povos indígenas e comunidades tradicionais; associações de produtores e sindicatos patronais; pequenos produtores; defensores de direitos humanos; etc.

  • Visitas de campo. Mesmo que lideradas por equipes técnicas ou agrícolas podem ser ajustadas para identificar e avaliar adequadamente as questões de direitos humanos na empresa e em sua cadeia produtiva. As visitas permitem:

    • Observar as instalações da empresa e das condições de trabalho.
      Por exemplo: estruturas de vivência nas frentes de trabalho; ou se há crianças ou jovens realizando atividades perigosas.

    • Realizar entrevistas com alguns atores relevantes, considerando tempo e recursos adequados para isso, incluindo um espaço seguro e apropriado.

C. Identificação das pessoas potencialmente afetadas. Essa etapa consiste em entender quais detentores de direitos estão sob maior risco de sofrer abusos de direitos humanos em relação aos riscos identificados no setor de açúcar em cada região produtora. Se a identificação dos riscos estiver concentrada nas operações de uma empresa específica, a identificação dos detentores de direitos precisa estar relacionada a empresa. É também uma oportunidade de começar a entender quem são os atores relevantes a serem envolvidos no processo e qual seria a melhor abordagem para seu engajamento.

Com base nas referências institucionais nacionais e internacionais como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) do Brasil, a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, Convenções da OIT e legislações sobre Devida Diligência, os riscos mais frequentes aos trabalhadores e comunidades em matéria de direitos humanos no setor canavieiro no Brasil são os seguintes:

Trabalho forçado
Trabalho infantil
Condições trabalhista (contratação, jornada, remuneração).
Saúde e segurança (alojamento, treinamento, acesso à água potável, acidentes, área de vivência, acesso a equipamentos de proteção individual gratuitos)
Assédio/tráfico de pessoas/tortura e crueldade
Discriminação de gênero e abusos contra as mulheres
Liberdade de associação e negociação coletiva
Consentimento livre, prévio e informado (para uso de recursos pertencentes a comunidades indígenas e tradicionais)
Direito à terra e aos recursos naturais/ proteção contra despejo ilegal
Contaminação do solo, água e ar; emissões de gases poluentes (práticas como a queima da palha, além da liberação de gases de efeito estufa, também podem provocar problemas respiratórios para trabalhadores e comunidades do entorno); consumo excessivo de água

Veja abaixo alguns exemplos de detentores de direitos que podem correr o risco de sofrer abusos de direitos humanos no setor da cana-de-açúcar no Brasil:

  • Trabalhadores temporários empregados durante a época da colheita, plantio ou outras atividades produtivas

  • Trabalhadores migrantes

  • Trabalhadores jovens

  • Comunidade local, morando nos arredores da usina e/ou áreas de produção

  • Comunidades que utilizam recursos ambientais em comum ou que podem ser afetados pelo uso de recursos hídricos ou do solo

  • Povos e comunidades indígenas e tradicionais que possam vir a ser impactadas pelas atividades da usina e de seus fornecedores

  • Defensores de direitos humanos

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Saliência dos riscos em direitos humanos

Após a identificação e o entendimento dos riscos e impactos em direitos humanos pertinentes, o próximo passo é determinar seu nível de saliência, considerando seu nível de severidade e a probabilidade de ele ocorrer no contexto operacional da empresa e de seus fornecedores.

A severidade do risco é avaliada a partir de três diferentes fatores:

  • Abrangência: quão generalizado é o dano?

  • Gravidade: quão sério é o dano?

  • Irremediabilidade: o dano pode ser corrigido?

Para que um risco seja considerado severo, basta a presença significativa de um desses três fatores.

Já a probabilidade indica qual é a chance de o risco ocorrer em diferentes situações. Ela deve ser considerada somente depois que as considerações de severidade foram levantadas.

Na determinação da saliência de riscos em direitos humanos na produção de commodities agrícolas podemos considerar, por exemplo, características de diferentes etapas de produção e perfis de fornecedores, dentre outros fatores.

Os riscos ocorrem com maior ou menor probabilidade em quais etapas de produção da commodity?

  • Considerar tipo e quantidade de mão de obra necessária para cada etapa produtiva
    Exemplo: atividades com maior incidência de trabalho manual e contratação de terceiros podem indicar uma probabilidade maior de condições trabalhistas inadequadas, e até mesmo de trabalho forçado.

  • Considerar nível de exposição a atividades de risco em etapas de produção específicas. Exemplo: a aplicação incorreta de agroquímicos pode trazer impactos significativos na saúde de trabalhadores (devido ao uso inadequado do EPI) e de comunidades do entorno (através de contaminação do ar, água e solo).

Os riscos ocorrem com maior ou menor probabilidade em quais perfis de fornecedores existentes?

  • Considerar se o fornecedor está localizado em uma região geográfica de alto risco para direitos humanos
    Exemplo: regiões com histórico de conflitos agrários; denúncias de trabalho forçado ou infantil etc.

  • Verificar maturidade de seu sistema de gestão
    Exemplo: possui política de direitos humanos, estabelece termos de conduta com seus fornecedores, possui mecanismo de queixas estruturado, faz algum tipo de verificação em direitos humanos em seus fornecedores e serviços terceirizados etc.

  • Entender se o fornecedor faz uso de trabalho manual ou de migrantes/imigrantes, contratação de serviços terceirizados, dentre outros fatores.

No contexto da produção de cana de açúcar no Brasil, podemos considerar alguns dos seguintes fatores de risco para determinação da saliência dos riscos e impactos em direitos humanos:

FORMA DE CONTRATAÇÃO DE MÃO DE OBRA:

Trabalhadores próprios de usinas e fornecedores tendem a ter relações trabalhistas mais estabelecidas, cumprindo com legislações nacionais e locais, e adesão de seus trabalhadores a sindicatos e associações.

Trabalhadores terceirizados através de empresas prestadoras de serviço, agentes ou outros intermediários podem estar sujeitos a riscos maiores em direitos humanos, por conta de uma maior dificuldade de verificar as condições trabalhistas e de contratação às quais estão submetidos.

Alguns prestadores de serviço podem não cumprir com os padrões de respeito aos direitos humanos estabelecidos contratualmente, por diversos motivos. Por exemplo, a necessidade de rápida substituição de mão de obra temporária (em caso de faltas ou afastamento de trabalhadores) para entrega do serviço no prazo acordado contratualmente pode resultar na contratação informal ou irregular de trabalhadores.

A terceirização, e até mesmo a quarteirização da cadeia produtiva, dificultam ainda mais o controle sobre esses prestadores e pode representar um desafio significativo de uma boa implementação dos compromissos em Direitos Humanos.

Trabalhadores migrantes e imigrantes são grupos vulneráveis com maior probabilidade de estarem sujeitos a condições precárias de alojamento, condições trabalhistas e de contratação inadequadas, além de limitações de idioma (principalmente para trabalhadores imigrantes) o que pode inviabilizar o acesso desses trabalhadores a mecanismos de queixas, por exemplo.

A presença de associações e sindicatos de trabalhadores também é um fator importante a ser considerado. Em locais com uma presença mais forte desses atores, os trabalhadores tendem a ter acesso a melhores condições trabalhistas e são capazes de levantar suas demandas de maneira mais eficaz.

MÃO DE OBRA NECESSÁRIA EM DIFERENTES ETAPAS PRODUTIVAS
A quantidade e tipo de mão de obra necessária pode aumentar a probabilidade de ocorrência de riscos para pessoas, especialmente em períodos ou prazos curtos de contratação. Atividades manuais geralmente requerem a contratação de um maior número de pessoas. Nesses casos, há maiores chances de haver contratação informal ou irregular de trabalhadores, fornecimento inadequado de estrutura em campo (área para descanso e alimentação, acesso à água potável, instalações sanitárias), condições inadequadas de alojamento para trabalhadores temporários e seus familiares, dentre outras questões.

No sudeste do Brasil, por exemplo, onde a colheita da cana-de-açúcar é quase 100% mecanizada, a incidência de impactos em direitos humanos pode ser mais significativa nas etapas de plantio, onde há maior necessidade contratação de trabalhadores rurais temporários, na maior parte feita por meio de intermediários e prestadores de serviços. Já no Nordeste do país, ainda existe a possibilidade de colheita manual da cana-de-açúcar, incluindo a queima, o que pode resultar em prejuízos à saúde dos trabalhadores (principalmente quando há falta de fornecimento e uso incorreto de EPIs) além de contaminação do ar nos arredores da usina, impactando a saúde e bem-estar de comunidades vizinhas.

Além disso, alguns processos produtivos podem não empregar uma grande quantidade de mão de obra, mas possuem um potencial de severidade também elevado. A etapa de tratos culturais da cana-de-açúcar, por exemplo, inclui a aplicação de produtos químicos danosos à saúde humana. A falta ou uso incorreto de EPIs pode provocar sérios danos aos trabalhadores. Além disso, o potencial de contaminação de solo e cursos d’água é muito mais elevado, podendo atingir comunidades e pequenos produtores no entorno.

CONHECIMENTO E ENGAJAMENTO DO FORNECEDOR COM A TEMÁTICA DE DIREITOS HUMANOS
A falta de conhecimento por parte do fornecedor ou até mesmo a importância que este dá para a temática de direitos humanos é uma consideração importante para a caracterização dos riscos. Por exemplo, a falta de espaços de higiene e limpeza específicos para mulheres pode se dar pela falta de importância que um fornecedor dá ao tema e nem tanto pela falta de recurso para a sua disponibilização.

TAMANHO E ESTRUTURA DO FORNECEDOR DE CANA-DE-AÇÚCAR
É importante diferenciar o tamanho e estrutura das empresas fornecedoras. Usinas maiores costumam ter uma disponibilidade maior de recursos para investir em acesso a tecnologias, processos mecanizados e com uso de mão de obra mais qualificada, além de apresentarem requisitos mais rígidos em questões de sustentabilidade e direitos humanos por exigência dos mercados internacionais para exportação (como os da Europa ou Estados Unidos), por questões de risco reputacional e pressões de investidores, sociedade civil clientes, ou outros atores.

A saliência pode ser registrada através de um mapa de calor e vai depender do contexto operacional e estrutura da empresa e do setor, variando à medida que os riscos e impactos são abordados. Segue exemplo abaixo:


Figura 1: Mapa de calor de saliência de riscos em direitos humanos para o setor sucoenergético da região sudeste do Brasil

  • Vermelho: mais severos e prováveis que precisam ser tratados primeiro.

  • Amarelo escuro: níveis intermediários de severidade e probabilidade. São os riscos que devem ser abordados posteriormente, à medida que os recursos se tornarem disponíveis.

  • Amarelo claro: baixa severidade e baixa probabilidade de ocorrência. Esses são os riscos que a empresa pode deixar para um momento posterior, dependendo dos recursos disponíveis.

Priorização de riscos e impactos

Na priorização dos impactos para tomada de ação o risco para pessoas deve ser colocado sempre em primeiro lugar. Com isso em mente, é importante considerar, na seguinte ordem:

o A gravidade do impacto ou os quais uma resposta tardia os tornaria irremediáveis

o A probabilidade de um impacto de gerar maiores danos dentro do contexto no qual foi identificado ou ser/se tornar recorrente

o A capacidade dos parceiros de negócios de gerenciar riscos e impactos com eficiência e eficácia

o  A disponibilidade de recursos (humanos, financeiros etc.) da empresa para abordá-lo

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Entendimento da(s) causa(as) raiz(es) dos reais e potenciais impactos identificados

Uma vez identificados os riscos e as pessoas mais afetadas, é importante entender as causas raízes dos principais riscos identificados. Para isso, a empresa precisa identificar fatores subjacentes que contribuam para o risco ou para a ocorrência de abusos em direitos humanos.

Ao realizar uma análise de causa raiz, a empresa será capaz de implementar as ações necessárias para abordar as causas raízes e não apenas a causa imediata daquele impacto. É importante reforçar que um mesmo impacto geralmente tem mais de uma causa raiz. Um tratamento adequado do impacto requer uma visibilidade dessas diferentes causas. Portanto, é necessário definir ações que busquem investigá-las mais a fundo, trazendo para dentro desse processo as partes afetadas ou potencialmente afetadas. Caso a análise de causa raiz não seja bem realizada, as ações para sanar o impacto e prevenir ou mitigar danos futuros pode não ser eficaz.

Uma das técnicas muito utilizadas para identificar a causa raiz é a abordagem dos “Cinco porquês”[1], que consiste basicamente em fazer uma série de perguntas “por que?”[2] até identificar a causa raiz de um problema. O exemplo abaixo pode ajudar a entender melhor esta técnica:

Em resumo, a identificação da causa raiz considera os seguintes passos:

  1. Documentar o evento/problema, com o relato dos fatos

  2. Formular uma declaração do problema a ser abordado

  3. Identificar e coletar dados e depoimentos das pessoas envolvidas ou afetadas

  4. Desenvolver um cronograma do evento

  5. Adotar uma técnica de análise de causa raiz, como os “Cinco Porquês”

  6. A partir das causas potenciais identificadas, planejar e implementar ações que abordem as causas raízes do problema, priorizando ações com base nos critérios de priorização apresentados anteriormente

  7. Se do processo de monitoramento, conclui-se que as ações não funcionarem, repetir as etapas e análise e reelaborar o plano de ação até que o problema seja resolvido


[1] Há outras técnicas possíveis para identificação de causa raiz como análise de Pareto, espinha de peixe ou Ishikawa, análise dos modos e efeitos de falha (FMEA), árvore de problemas, e campo de forças.

[2] O objetivo desse exercício é encontrar a causa raiz do problema, independentemente da quantidade de perguntas necessárias. Portanto, não é uma regra realizar a análise com 5 por quês, podendo ser menos ou mais.

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Considerações sobre grupos vulneráveis

A identificação dos riscos e das pessoas mais vulneráveis só pode ocorrer quando há um envolvimento aberto e significativo com os detentores de direitos diretamente (por exemplo, trabalhadores contratados em suas operações próprias) ou por meio de organizações que trabalham com eles (por exemplo, sindicatos).

Em alguns casos, esses atores podem apresentar mais de um fator de vulnerabilidade, aumentando a possibilidade de se sujeitarem a condições que violem seus direitos humanos fundamentais. Por exemplo, trabalhadores que contam com menor rede de proteção e apoio (ex: imigrantes ou refugiados) podem ser levados a aceitar oportunidades que prejudiquem sua saúde e segurança, flexibilizando seus direitos trabalhistas, e podendo resultar em consequências negativas e até mesmo irremediáveis. Além disso, no caso de trabalhadores serem mulheres, podem ainda estar sujeitas a maiores níveis de assédio (moral, sexual, etc.).

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Desafios e recomendações

Os impactos em direitos humanos são particularmente observados a partir da violação contínua contra pessoas ou grupo de pessoas, comunidades e meio ambiente. Nem sempre é evidente para empresas até onde vai a sua responsabilidade de respeitar os direitos humanos, pois muitas empresas acabam vendo seu impacto de forma mais limitada ou têm dificuldade em identificar os elementos para avaliar o impacto.

Isso acontece, por um lado, pela ausência de normas e exigências claras sobre as ações que devem tomar e, por outro, porque suas operações muitas vezes abrem margem para a “flexibilização pontual” das condições de trabalho.

Como exemplo, quando uma usina de cana-de-açúcar contrata por um período curto um fornecedor de cana que não é o agricultor primário, pode tornar mais difícil identificar as condições da sua contratação, levantar e monitorar indicadores precisos para acompanhar a real proteção dos direitos humanos. Os desafios aqui podem ser superados ao definir uma rede entre os produtores de cana que assumam compromissos em comum em direitos humanos e que possam garantir condições mínimas para a contratação de fornecedores que também estejam comprometidos nesta matéria e que possam ser fiscalizados.

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Checklist

Foi realizada uma análise geográfica para identificar os riscos e impactos específicos em diretos humanos?

Foi realizada uma análise operacional para identificar os riscos e impactos específicos em diretos humanos, utilizando documentos internos, registros de queixas, consultando as partes interessadas e fazendo visitas a campo?

Foi realizado um cruzamento das informações a partir de análises anteriores, confirmando se há menções sobre questões de direitos humanos em municípios ou regiões onde a empresa opera?

Foi feita uma listagem de riscos e atores potencialmente afetados e que podem estar relacionados à empresa?

Foi possível determinar o nível de saliência do risco ou impacto, considerando seu nível de severidade e a probabilidade de ele ocorrer no contexto operacional da empresa e de seus fornecedores?

Foi possível fazer uma priorização dos riscos, identificados a partir da gravidade, da probabilidade de gerar dano, da capacidade de gerenciar riscos e da disponibilidade de recursos em endereçá-los?

Foi realizada uma consulta aos grupos interessados e afetados para garantir que a identificação e a classificação feita são pertinentes?

Foi realizada uma análise de causa raiz, utilizando uma (ou mais) técnicas para identificar fatores subjacentes que contribuam para o risco ou para a ocorrência de abusos em direitos humanos?

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Biblioteca de ferramentas

Nesta seção, você encontrará algumas ferramentas que podem ajudá-lo no processo de identificação de riscos e impactos


PRÓXIMO – Nota informativa 3, Agir e Integrar, onde será abordado o processo de definição e implementação de ações para abordar questões de direitos humanos.

Assessment - UNDP (hrdd-assessment.org): Ferramenta de autoavaliação para treinamento sobre riscos em direitos humanos, incluindo sua classificação por nível de gravidade e probabilidade. Ao final, é gerado um mapa de calor para cada risco, que pode apoiar a priorização dos riscos e impactos para ação.

LandAssess Tool (landesa.org): Ferramenta desenvolvida pela Landesa destinada a empresas do início da cadeia proprietárias de terras com perguntas orientadoras para avaliação de riscos e impactos em povos indígenas e comunidades locais. Inclui também a estrutura para criação de planos de ação para abordar os riscos e impactos adversos identificados.

De olho nos ruralistas, Comissão Pastoral da Terra, Índice de Vulnerabilidade da InPacto, Lista Pública do Trabalho Forçado: Estes são alguns exemplos de páginas de internet ou plataformas específicas para a identificação de possíveis conflitos de terra entre empresas e comunidades ou pequenos produtores. Também é possível identificar se empresas ou produtores são citados com práticas de trabalho análogo ao escravo, situação de vulnerabilidade socioeconômica de municípios, entre outras informações.