Guia de Engajamento com as Partes Interessadas  


Introdução

Este guia foi elaborado para orientar as equipes da organização implementadora na segunda etapa do nosso trabalho de avaliação de riscos. Ele se concentra especificamente no setor sucroenergético, abrangendo níveis nacional, regional ou local. 

A avaliação de riscos em direitos humanos (ARDH) é um processo fundamental para a devida diligência em direitos humanos (DDDH). Embora a consulta com as partes interessadas seja parte de todas as etapas da DDDH, este guia se aprofunda especificamente nas fases de "Identificar e Agir", "Integrar" e no acompanhamento/ monitoramento da implementação das ações, que estão diretamente ligadas à ARDH. 

Não existe uma abordagem única para o engajamento com as partes interessadas. No entanto, este documento apresenta alguns princípios essenciais para ajudar usinas e empresas a aprofundar sua compreensão sobre questões e impactos em direitos humanos. O engajamento com as partes interessadas mais relevantes é crucial para enriquecer nossa compreensão de questões importantes e suas causas, ajudando a garantir que os riscos não se tornem impactos. 

Nota sobre Causa Raiz: Durante as ARDH, é comum detextar questões de direitos humanos e seus sintomas. Em nossas avaliações, buscamos ir além da identificação de causas superficiais de um problema, explorando as causas mais profundas para determinar ações/soluções que possam mitigar e previnir, de forma sistemática, problemas atuais e potenciais.

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Termos chave (Partes Interessadas, Detentores de Direito & Representantes) 

PARTE INTERESSADA

Uma parte interessada pode ser uma pessoa, grupo ou organização que tenha interesse em ou possa afetar um negócio ou suas atividades, assim como aqueles que possam ser impactados por ele.

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TITULARES DE DIREITO

Todos as pessoas são titulares de direitos. Entretanto, neste contexto, o foco está nas titulares de direitos que são particularmente vulneráveis a impactos adversos

REPRESENTANTES

Procuradores podem ser pessoas representantes (formais ou informais) de grupos afetados ou especialistas em direitos humanos. Por exemplo: ONGs, sindicatos, organizações comunitárias ou organizações internacionais.

Etapas para as consultas às partes interessadas 

As consultas a partes interessadas podem ser divididas em quatro etapas principais: 

Identificação de Partes Interessadas Relevantes

Mapear e priorizar as partes interessadas para engajamento

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Planejamento

Considerar os tempos, formatos e conteúdos.

Planejamento do Conteúdo das Consultas

As equipes de avaliação podem precisar adaptar cada engajamento às particularidades das partes interessadas relevantes. Assim, em vez de um conjunto fixo de perguntas, este guia propõe três etapas principais para orientar as consultas: 

Engajar com partes interessadas

Alcance e entrevista

Analizar os resultados e incluir a análise

Revisar os dados e incluir no relatório completo da ARDH

Identificação de partes interessadas relevantes para a consulta

Embora fosse ideal que nossas equipes consultassem diretamente uma ampla gama de titulares de direitos relevantes, isso nem sempre é viável ou apropriado. Os Princípios Orientadores da ONU (UNGPs) reconhecem que empresas situadas mais no final da cadeia, em particular, podem precisar confiar no engajamento com representantes para obter percepções sobre riscos e problemas no início da cadeia. 

É importante consultar uma variedade de titulares de direitos e seus representantes no setor sucroenergético. Em muitos casos, não é viável ou apropriado envolver diretamente cada indivíduo, por isso nos apoiamos em representantes de confiança, como sindicatos locais, associações de pequenos produtores ou organizações de Povos Indígenas e Comunidades Locais (IP&LC). 

A identificação dessas partes interessadas deve começar com o mapeamento inicial da análise documental da avaliação de riscos em direitos humanos (ARDH). No entanto, pesquisas adicionais podem ser necessárias para preencher lacunas e garantir que todas as vozes importantes sejam consideradas. A seleção de quem consultar deve priorizar os três grupos temáticos que se encontram em maior condição de vulnerabilidade no setor: trabalhadores, comunidades e pequenos produtores

Em cada avaliação, a organização implementadora deve buscar realizar, no mínimo, 8 a 10 grupos de consulta. O número exato deve ser ajustado com base nos riscos e questões priorizadas na análise documental. Se houver diversas questões salientes em diferentes temas, pode ser necessário aumentar o número de consultas, levando em conta o orçamento do projeto. 

Por exemplo: se foram identificadas três questões distintas — trabalho infantil, direitos territoriais de povos indígenas e meios de subsistência de pequenos produtores — pode ser necessário consultar mais de 10 partes interessadas. 

Para que a seleção de partes interessadas seja eficaz, é preciso considerar alguns fatores essenciais. O objetivo é criar um grupo diversificado que ofereça perspectivas amplas e equilibradas sobre o tema. 

  • Conhecimento e Experiência: Priorize pessoas e organizações que tenham conhecimento específico sobre as questões em pauta e sobre a área geográfica do projeto. 

  • Representatividade: Garanta a participação de uma combinação variada de grupos relevantes, como sindicatos, ONGs, associações empresariais e representantes das comunidades. 

  • Viés e Relações de Poder: Esteja atento a possíveis vieses ou desequilíbrios de poder. Por exemplo, ao consultar órgãos do governo ou grupos de um setor específico, considere como suas opiniões podem estar influenciadas por suas posições e interesses. Procure equilibrar essas perspectivas com as de grupos mais vulneráveis ou menos representados. 

  • Priorização: Diante das limitações de tempo e orçamento, priorize as partes interessadas com base nas questões mais urgentes identificadas no projeto. 

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Planejamento

Um bom planejamento é essencial para garantir que as consultas sejam eficazes e que a informação coletada seja útil. Essas consultas são também uma oportunidade para iniciar ou fortalecer relacionamentos com partes interessadas-chave. 

Para que as consultas sejam bem-sucedidas, é preciso considerar os seguintes pontos: 

  • Tempo: As consultas devem ser agendadas em períodos que permitam a participação das partes interessadas. Evite feriados, eleições ou outras datas sensíveis que possam comprometer a segurança ou a participação. No setor sucroenergético, é estratégico alinhar o cronograma com o ciclo da cana. Agende consultas com trabalhadores no início ou no fim da colheita, e com a equipe interna da usina ou pequenos produtores fora desse período. 

  • Local e Formato: Reuniões presenciais são ideais, mas se não forem viáveis, as consultas podem ser realizadas virtualmente. Discuta com a equipe do projeto as implicações orçamentárias de qualquer viagem necessária. As reuniões podem ser individuais ou em grupo, dependendo do contexto. Outros formatos, como questionários ou entrevistas telefônicas, também podem ser considerados. 

  • Conteúdo: As consultas devem ser semiestruturadas. As perguntas devem ser flexíveis, permitindo adaptação às respostas e à fluidez da conversa. A seguir, detalhamos as etapas para guiar o conteúdo das consultas (ver abaixo). 

Validar resultados da análise documental 

  • Validar resultados da análise documental 

  • Validar com o stakeholder as questões identificadas como salientes na análise documental 

  • Confirmar quais atividades ou ações estão causando ou contribuindo para os riscos ou impactos 

  • Verificar quais grupos estão mais em risco 

  • Identificar e confirmar onde persistem lacunas de dados 

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Reunir informações sobre oportunidades de ação 

  • As partes interessadas podem oferecer contribuições relevantes sobre tipos de intervenções e oportunidades para enfrentar as questões salientes identificadas (ex.: iniciativas contra o trabalho infantil, programas de subsistência para pequenos produtores, coalizões de organizações para enfrentar o trabalho forçado). 

  • Essas sugestões serão úteis para desenvolver a combinação de ações mais apropriada (dentro das operações da usina e/ou junto a outros atores dentro ou fora da cadeia). 

  • Após o levantamento de ações para eliminar ou mitigar os riscos, é importante considerar quais são factíveis de ser implementados a curto e médio prazo (prazo sugerido até 1 ano), considerando o contexto não propício para a sua implementação.

Acompanhar e validar o plano de ação 

  • Obter feedback sobre a eficácia das ações implementadas e validar a pertinência do plano de ação. (link de plano de ação). Isso permite ajustar a estratégia conforme necessário, garantindo que as intervenções realmente abordem os riscos de forma efetiva. 

Engajamento com as partes interessadas

Durante as consultas, é fundamental ser transparente sobre o escopo da avaliação e como as contribuições serão utilizadas. Isso é crucial para estabelecer confiança e credibilidade.

Caso a sua equipe não tenha o conhecimento ou a experiência necessária para conduzir essas consultas, ou se houver questões sensíveis ou conflitos de interesse, considere o apoio de consultores externos ou organizações especializadas. Isso pode garantir mais neutralidade ao processo e proteger a organização implementadora de associações diretas com os riscos identificados.

Se as partes interessadas não estiverem familiarizadas com esse tipo de trabalho, reserve um momento para apresentar seu processo e objetivos, ajustando as expectativas. Seja claro sobre seu papel e sua intenção de usar a avaliação para orientar as ações, mas seja cauteloso com a linguagem. Não assuma compromissos de apoiar intervenções específicas ou financiar projetos, pois isso pode gerar expectativas indevidas.

Nota sobre o resultado da participação das partes interessadas:

É importante que as partes interessadas sintam que suas vocês foram ouvidas. O planejamento orçamentário deve contemplar algum tipo de retorno a cada pessoa/organização consultada, ao menos por e-mail. Isso pode incluir um resumo do que entendemos de sua consulta e um pedido de confirmação ou perguntas adicionais.

Análise dos Resultados e Integração das Conclusões

Uma avaliação de riscos robusta segue um fluxo lógico e sequencial. A análise documental e a revisão bibliográfica são a primeira etapa para levantar os riscos preliminares. O objetivo das consultas com as partes interessadas, que vêm na sequência, é justamente validar ou refutar esses achados iniciais. O engajamento em campo permite coletar informações que contextualizam os riscos e ajudam a compreender as ações que levam a eles. 

Após o trabalho de campo, é essencial combinar as informações obtidas nas consultas com os dados da análise documental, integrando e verificando os achados. Por exemplo, se a análise documental apontou informações que foram amplamente refutadas pelas partes interessadas, isso pode indicar que os dados anteriores não são mais válidos. 

A seguir, apresentamos a sequência para guiar a análise e a tomada de decisões: 

 

  1. Revisão bibliográfica: Levantamento de riscos e questões a partir de fontes secundárias. 

  1. Levantamento de riscos: Identificação de riscos em conjunto com a usina. 

  1. Validação com as partes interessadas: Consultas em campo para validar ou refutar os riscos levantados e aprofundar a compreensão das causas. 

  1. Análise e consolidação: Unir os dados da análise documental e das consultas para uma conclusão robusta. 

  1. Priorização: Usar uma matriz de riscos para priorizar as questões mais salientes. 

  1. Análise de causa raiz: Aprofundar a compreensão dos fatores por trás dos riscos mais críticos. 

 

Com todas as conclusões consolidadas, a organização implementadora deve elaborar um único relatório de Avaliação de Riscos de Direitos Humanos (ARDH). Este relatório deve apresentar as conclusões de forma integrada e clara, incluindo um mapa de calor que ilustre a saliência dos riscos. 

Vale lembrar que a consulta contínua com as partes interessadas é fundamental para monitorar a implementação dessas ações e validar a eficácia do plano desenvolvido, garantindo que as intervenções sejam relevantes e efetivas ao longo do tempo. 

Aprofundar a compreensão das causas reais dos riscos 

  • Investigar as causas das questões identificadas. Ir além dos efeitos e sintomas óbvios em direção às causas que podem ser controladas e influenciadas. 

  • Perguntar às partes interessadas quais são os fatores que impulsionam a ocorrência de determinados problemas. Pode ser necessário perguntar “por quê” várias vezes até chegar à causa raiz do risco (link de causa raiz) 

  • O objetivo é compreender os fatores de fundo para que o risco seja realmente eliminado ou mitigado